Centro de gravidade da economia aponta para Ásia

Nas últimas duas décadas, o equilíbrio global de poder econômico mudou: embora as economias desenvolvidas representassem cerca de 80% do PIB global em 2000, essa proporção caiu para cerca de 60% em 2019, com a região da Ásia-Pacífico sendo responsável por 8pp desse declínio de 20pp. Para compreender o ritmo dessa mudança na economia global e identificar o impacto da crise da Covid-19, calculamos a posição do centro de gravidade econômico mundial ou “WECG” (World’s Economic Center of Gravity). Os resultados são apresentados na Figura 1.

Três tendências se destacam: Em primeiro lugar, parece muito claro que o WECG está se movendo em direção ao leste, para a Ásia. Nossos cálculos mostram que, no final da década de 1990, ele estava seguindo na direção oposta (em direção aos Estados Unidos), antes de estagnar em 2001 e dar meia volta em 2002. Esses anos demonstram as consequências da desaceleração do crescimento nas economias desenvolvidas e da entrada da China na Organização Mundial do Comércio.

Em segundo lugar, a crise da Covid-19 pode acelerar esse processo nos próximos anos, uma vez que a região Ásia-Pacífico deve se recuperar mais rápido do que outras partes do mundo. Ao longo de 2020-2021, o movimento anual em direção ao leste será cerca de 1,8 vezes maior do que o observado entre 2015-19. E em comparação com as trajetórias de crescimento de longo prazo projetadas antes da pandemia, o WECG se moverá para o leste em um ritmo 1,4x mais rápido entre 2020-2024.

Por fim, em 2030, com base em nossas previsões de longo prazo, observamos que o WECG pode estar próximo da confluência entre China, Índia e Paquistão. Isso reflete sobretudo a influência da economia chinesa no mundo, mas também, em menor grau, a atração de outras economias emergentes na Ásia (especialmente a Índia). De fato, o centro de gravidade econômico regional da Ásia-Pacífico não está completamente centrado na China: De 1998 a 2030, ele se moveu do sul da Coreia do Sul para a província de Sichuan, na China (no sudoeste do país, a cerca de 1.400 km de seu centro geográfico).

Figura 1: Centro de gravidade da economia mundial

Pontos azuis: 1998 a 2019. Pontos laranja: 2020, 2025 e 2030 nas projeções atuais. Pontos verdes: 2020, 2025 e 2030 nas projeções do quarto trimestre de 2019. Pontos cinza: centro de gravidade geográfico dos EUA, Alemanha, Índia, China e Japão.

Fontes: Euler Hermes e Allianz Research

A CHINA SAIRÁ COMO VENCEDORA RELATIVA NO MUNDO PÓS COVID-19

A economia chinesa se recuperou mais rapidamente do choque econômico causado pela Covid-19. O PIB cresceu +2,3% em 2020; projetamos uma recuperação mais forte em 2021 (+8,2% vs. +4,6% para o mundo). O fato de a epidemia ter chegado mais cedo, bem como a rápida reação em termos de políticas, a prevalência do setor estatal e alguns efeitos inesperados explicam o desempenho superior. Para conter o choque, políticas de apoio foram colocadas em prática: estimamos que os pacotes de estímulo fiscal em 2020 tenham apoiado o crescimento do PIB da China em +4,1 pp, em comparação com +1,7 pp nos EUA e +1,3 pp na Alemanha. A prevalência do setor estatal na China também pode ter facilitado a implementação de medidas em termos de políticas públicas e o reaquecimento da economia, antes que a recuperação se tornasse mais ampla. Os dados sugerem que as empresas estatais estavam mais protegidas, instadas a manter a atividade econômica e a reter empregos (mesmo que não gerassem lucro). O país também conseguiu colher os benefícios de ser a primeira economia a entrar e a primeira a sair da epidemia.

Com a recuperação econômica se fortalecendo e se tornando mais ampla, a China reduziu as políticas de apoio monetário no quarto tri de 2020. Por sua vez, o crescimento do crédito desacelerou nos últimos dois meses do ano passado. Agora, o objetivo é introduzir disciplina nos mercados de capitais (especificamente no mercado de títulos corporativos) a fim de controlar os riscos financeiros de longo prazo. Isso implica que, no que tange a normalização das políticas públicas e legados de longo prazo, a China também está um passo à frente do resto do mundo, onde a maioria dos governos ainda está no modo de “flexibilização total”.

O desempenho superior da economia chinesa e a probabilidade de que ela saia dessa situação com menos arranhões abrem caminho para que ela seja posicionada como vencedora relativa no mundo pós-Covid-19. Estimamos que China pode estar ganhando dois anos em relação às economias desenvolvidas em comparação com a trajetória de crescimento de longo prazo pré-crise (ver Figura 2). Mais especificamente, agora antecipamos que o PIB da China corresponderá ao dos EUA em 2030, em vez de 2032 com base em nossas previsões anteriores. Em termos nominais (dólar na cotação atual), a proporção do PIB da China sobre o PIB dos EUA foi de 67% em 2019, ante 61% em 2015. Esperamos agora que a proporção alcance 75% em 2021. Isso se compara a uma proporção de 71% com base nas projeções no final de 2019 (antes da pandemia).

É claro que este caminho de longo prazo também traz obstáculos potenciais: A prevalência do setor estatal pode aumentar os riscos de longo prazo de excesso de capacidade, aumento do endividamento, zumbificação e lentidão em termos de avanços tecnológicos. As autoridades chinesas estão tentando enfrentar esses riscos estruturais e planejando a longo prazo com o 14º plano quinquenal (2021-2025) e a visão para 2035. A estratégia de dupla circulação reafirmou que um dos principais objetivos finais é alcançar a autonomia industrial (impulsionando o mercado doméstico e a P&D e reduzindo a dependência das importações), enquanto o comércio e os fluxos de capital são liberados.

Figura 2: Proporção do PIB nominal da China para os EUA, antes e depois da crise da Covid-19